Reflexões

"Instruí-vos, porque precisamos da vossa inteligência. Agitai-vos, porque precisamos do vosso entusiasmo.

Organizai-vos, porque carecemos de toda a vossa força".
(Palavra de ordem da revista L'Ordine Nuovo, que teve Gramsci entre seus fundadores)

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junho 27, 2008

Entrevista com o filosofo José Salem

Na primeira parte desta obra denuncia com alguma insistência a tentativa por parte da historiografia burguesa de stalinizar inteiramente o período soviético. E contrapõe defendendo que se deveria falar «não de um regime mas antes de regimes soviéticos», tendo em vista as «diferentes fases» da sua história. Que fases são estas?

Fiz estudos em história de arte, mas não sou um historiador profissional, sou um estudante. Sou profissinal de filosofia, escrevo livros de filosofia, hoje há quem se diga filósofo por muito menos, mas a minha disciplina é de facto a filosofia.
Todavia, acho impensável que depois de se ler a história da URSS, mesmo que superficialmente, de se ouvir falar de destalinização, do famoso relatório de Khruchov ao XX Congresso do PCUS, se insista em enfiar no mesmo pacote os 70 anos de socialismo soviético.
Não podemos afirmar que Khruchov e Stáline são idênticos, que o são Andropov e Stáline ou Brejnev e Stáline.
As discussões sobre o exercício despótico do poder, iniciadas durante o período soviético na própria União Soviética, são um sinal evidente de que não se tratou de um cancro associado à essência do sistema mas de um problema que merece ser debatido e estudado e que terá sido condicionado também por determinadas circunstâncias históricas.
De resto é um problema localizável. Até Hannah Arendt [autora alemã que tenta assemelhar o nazismo e o comunismo como ideologias totalitárias] situa esses períodos nos anos 32, 36, 37 e 38.
Temos de estudar a história seriamente, não como muitos sovietólogos que se dedicam a criar slogans. Um deles até já ousou escrever (cito Alain Besançon, membro da Academia das Ciências Morais e Políticas de Paris), que em matéria de soviétologia «nem sequer vale a pena mantermo-nos actualizados. O que é preciso é aprender a crer no inacreditável». Eis pois uma afirmação extraordinária de alguém que passa por um sábio.
Uma das questões que temos de abordar com seriedade é a aritmética macabra que nos foi imposta. Eu peço que nos expliquem esta história digna de um conto de fadas, que recorre a categorias do tipo Branca de Neve e os Sete Anões.
Em 1956 tinha apenas quatro anos de idade. Só mais tarde, naturalmente, ouvi falar do XX Congresso do PCUS. Nos anos 70, era eu membro das juventudes comunistas em França, começou-se a falar cada vez com mais frequência de um milhão, dois milhões, de três ou quatro milhões de vítimas da repressão stalinista, pressupondo-se evidentemente que numa revolução nem todos os mortos são vítimas inocentes executadas por erro.
Entre os anos 70 a 85, ou seja 30 anos depois do XX Congresso, assistiu-se ao inflacionamento demencial dos números (40 milhões, 60 milhões, etc.), a uma assimilação grotesca do stalinismo ao nazismo, e logo do sovietismo e do socialismo em geral ao nazismo.
O que penso é que esta aritmética macabra tem de ser verificada e, evidentemente, desmentida já que é demasiado extraordinária para poder ser verdade.

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